|
O ISLAM E O SUFISMO
Sheikh Muhammad Ragip al-Jerrahi*Texto informativo – setembro 2000 1. Origem histórica Historicamente, pode-se dizer que a religião islâmica surgiu a partir do ano 610DC, com o início da revelação do Sagrado Alcorão. O profeta Muhammad
(saws) meditava, solitariamente, em uma gruta nas montanhas de Hira, distante alguns quilômetros da cidade de Meca, na hoje Arábia Saudita, quando apareceu o Anjo Gabriel (as), ordenando-lhe ler as primeiras palavras do
Livro Sagrado. Tremulo e febril, o Profeta (saws) não compreendeu a experiência extraordinária pela qual passava, mas encontrou em sua fiel esposa Khadija apoio e suporte para assimila-la, nestes difíceis momentos
iniciais da revelação. A partir de então, durante 23 anos, o anjo trouxe gradativamente a palavra divina para nossa realidade na forma de um livro revelado. Nesta época, Meca era dominada pela idolatria, e a mensagem trazida pelo Profeta Muhammad (saws) afirmando a existência de Deus Uno e Único, que ordenava a justiça e
tolerância, o comportamento ético e humanitário, o respeito aos direitos dos seres humanos homens e mulheres, encontrou forte oposição. Os primeiros muçulmanos foram maltratados e humilhados enfrentando as mais cruéis
perseguições e torturas. Em 622 DC, buscando sobreviver, retiraram-se da cidade de Meca e refugiaram-se na cidade de Medina, com apoio e suporte de seus habitantes. Este ano, 622 DC, dá início ao calendário islâmico. A
partir de Medina, a religião islâmica consolidou-se e iniciou sua expansão. Num período de menos de cem anos já estendia-se pelo norte da África, península ibérica na região do atual Portugal e Espanha, Pérsia, chegando
às fronteiras da China e da Índia. Justiça, respeito à lei, tolerância e espírito democrático foram fatores que facilitaram esta expansão, levando os muçulmanos a serem bem recebidos nas regiões a que chegavam. Nos
séculos que se seguiram o Islamismo contribuiu para o desenvolvimento do saber humano em diversas áreas como medicina, astronomia, álgebra, e mesmo na filosofia resgatando a obra dos pensadores gregos do passado.
Nos dia de hoje observa-se grande desconhecimento e confusão no mundo ocidental a respeito do Islamismo. Problemas políticos e
culturais que não têm relação com os ideais islâmicos são divulgados na imprensa como ligados ao Islamismo e como conduta típica de muçulmanos. Nada mais errado. Seria o mesmo que atribuir as atrocidades que às vezes
vemos em nosso país, ou outros países do mundo ocidental, às religiões que predominam aqui. Felizmente temos observado progressiva mudança, e os meios de comunicação estão gradativamente fazendo a distinção correta.
2. Significado de Islam Podemos nos aproximar da
compreensão do que é o Islamismo iniciando pela busca do entendimento do significado da palavra Islam. Um primeiro sentido
que extraímos do radical árabe é: Submissão voluntária à vontade de Deus. Nesta frase temos implícitos pelo menos três conceitos: A existência de Deus, uma atitude de submissão à vontade de Deus, e esta atitude como
resultado do exercício de uma escolha, por ser voluntária. Vamos agora considerar um pouco mais estes três aspectos A
existência de Deus é primeiro artigo da fé islâmica. No interior de cada ser humano, brilhando com maior ou menor intensidade, há uma semente de fé. Esta semente pode leva-lo a pressentir, ao constatar a sofisticação,
inteligência e ordem existente na natureza, a existência de um Ser Superior que tudo criou e que a tudo controla. No Islamismo este Ser é Uno e Único, como afirmado pelo profeta Abraão (as), é Allah (que significa Deus
no idioma árabe), Criador dos universos, possuidor de todo o Poder e de Vontade infinita. Vamos analisar agora o aspecto da
submissão à vontade de Allah. Nos dias atuais, mais do nunca, o progresso acelerado da ciência, torna fácil constatar que todos os componentes deste universo estão sujeitos a leis naturais que governam os fenômenos
físicos, químicos, biológicos, e assim por diante. Do macro ao microcosmo. Das estrelas e planetas seguindo suas órbitas sujeitas às leis da mecânica celeste aos seres vivos na superfície da Terra. Das galáxias e
aglomerados de galáxias às partículas subatômicas. Todo universo, o que inclui o ser humano, está sujeito a leis, isto é, está submisso à vontade de Allah. Mas o ser humano tem um aspecto adicional. Dotado de razão e inteligência, tem a capacidade de formar juízos e optar, tendo liberdade de escolha no que se refere ao seu
comportamento. Islam é optar voluntariamente por ajustar sua vida às leis divinas. Ao fazer esta opção o ser humano inicia uma trajetória que requer a busca do conhecimento, para conhecer e compreender as leis divinas,
as determinações que Allah prescreve, permitindo discernir o certo do errado, o verdadeiro do falso e aplicar este conhecimento à própria vida, como orientação para a própria conduta. Também implícito na raiz da palavra Islam, considerando-se as consoantes SLM, está o sentido de paz (Salam). Isto é, Islam também significa paz. Ao
harmonizar-se com as leis divinas o ser humano alcança equilíbrio e passa a desfrutar de paz interior, pois com compreensão elevada passa a perceber o significado de tudo e todas as coisas e sua função no esquema
cósmico da criação. Ao ajustar-se e integrar-se à ordem natural das coisas, com estabelecida por Allah, encontra paz e segurança. 3. Os Princípios da fé e os Cinco Pilares do Islam
Os princípios da fé islâmica são: Fé na existência de um único Deus, Allah, Criador dos céus e da terra, deste mundo e do
outro mundo, Sustentáculo de todo o Universo. Ele é antes do antes e depois do depois. Todo Poderoso, não depende de nada nem de ninguém, mas tudo depende dele. Perfeito, sem máculas e sem limitações. Sua essência é
inacessível à compreensão humana, mas a manifestação de seus atributos está presente em toda a criação. Fé na existência
dos anjos de Allah. Seres espirituais, puros e integralmente obedientes à Allah. São instrumentos da vontade infinita de Allah. Não devem ser adorados uma vez que toda adoração é devida somente à Allah, o Criador. Ao
criar Adão, Allah ordenou aos anjos prostrarem-se perante Adão, pois a Adão, o primeiro ser humano, Allah concedeu os segredos de Seus Nomes, que são a herança e tesouro oculto na existência de cada ser humano. Fé nos livros de Allah. Allah revelou Seus Livros sagrados aos Profetas. No Sagrado Alcorão são feitas referências ao livro
revelado ao Profeta Abraão (as), do qual não restam vestígios; à Torah (Pentateuco do velho testamento) revelado ao Profeta Moisés (as); aos Salmos, revelados ao Profeta David (as); ao Evangelho revelado ao
Profeta Jesus Cristo (as). Os livros sagrados não são criação de nenhum ser humano, mas a palavra de Allah trazida através do anjo Gabriel aos Profetas. Porém as pessoas introduziram alterações nos livros revelados
anteriormente ao Sagrado Alcorão, o que distorceu seu significado. O Sagrado Alcorão é o único livro sagrado que não sofreu alterações, guardando fidelidade com as palavras tais como foram reveladas ao Profeta
Muhammad (saws). Fé nos Profetas de Allah. Os Profetas são seres humanos especiais, que alcançaram a perfeição possível a
um ser humano, criados com a função de trazerem a Verdade a partir da Fonte Divina. As tradições nos informam que desde o primeiro Profeta que foi Adão (as), Allah enviou 124.000 Profetas, a todos os povos em
todas as épocas e em todas as partes do mundo. O Profeta Muhammad (saws) foi o último Profeta e fomos informados, pelo Sagrado Alcorão, de que com ele encerrou-se o envio de Profetas à humanidade. Fomos informados
também que Jesus Cristo retornará no final dos tempos. Fé no dia do Julgamento. Há uma outra vida após a morte no corpo
físico, e haverá um dia em que tudo será aniquilado, o Último Dia. Neste dia todos serão julgados segundo suas ações e intenções. Há também o pequeno dia do julgamento, que é o dia de nossa morte, onde é feito um
balanço de nossa existência terrena. Fé em que tudo que acontece, e que nos parece bom ou mau, está de acordo com a vontade
e conhecimento de Allah, que tudo conhece e tudo sabe. Nada acontece que não esteja de acordo com a vontade infinita de Allah. Além destes princípios da fé, é relevante mencionar as práticas básicas de todo o muçulmano e que constituem os cinco pilares do Islam: - Testemunhar que não há divindade a não ser Allah e que Muhammad é servo e mensageiro de Allah. Para testemunhar é necessário estar desperto e consciente.-
Cinco orações diárias. Na aurora, ao meio-dia, no meio da tarde, no crepúsculo e à noite, cinco vezes ao dia, os muçulmanos interrompem suas atividades por alguns minutos e voltam sua atenção e consciência para o
Criador, buscando orientação e bênçãos. - Jejuar no mês de Ramadan. Uma vez ao ano, neste mês, pratica-se o jejum, que consiste em abster-se de comer, beber e de relações sexuais desde o início da
alvorada até o por do sol. O jejum permite ao muçulmano tomar consciência das forças conflitantes entre sua natureza superior e a inferior. - Caridade. Uma vez ao ano o muçulmano deve dar aos
pobres 2,5% de sua riqueza líquida acumulada. - Peregrinação. Havendo meios para tal, fazer a peregrinação à Meca, Hajj, pelo menos uma vez na vida. 4. Islamismo no Brasil - Os negros e a escravidão A história do Islam no
Brasil começou já na expedição de Pedro Álvares Cabral, uma vez que dela participaram navegadores mouros. No período da colonização, muçulmanos foram trazidos da África como escravos. Muitos eram pessoas bem formadas,
professores, médicos, geógrafos. Quando descobertos eram obrigados a se converter e mudar seus nomes, devidos às leis impostas pela Inquisição. As primeiras lutas pela liberdade no Brasil foram lideradas por estes muçulmanos que fugiam e ajudavam a organizar os quilombos. O primeiro foi o Quilombo de Palmares,
centenas de outros surgiram depois. Mais referências sobre esta face da história podem ser obtidas no livro "Capitão Mouro" de Georges Latif Bourdouan - Ed Sol e Chuva, 1997.
Posteriormente, um grande fluxo de muçulmanos chegou com a imigração de povos de origem árabe, libaneses, sírios, egípcios, que constituem hoje o grande contingente de
muçulmanos no Brasil, estimado em mais de um milhão de fiéis. Atualmente muitos brasileiros têm se convertido ao Islam,
muitos em decorrência do interesse despertado pelo Sufismo que é a aspecto esotérico, místico da religião muçulmana.
5. O Sufismo As religiões, como tudo nesta existência, apresentam um aspecto exterior, formal e um aspecto interior em que
os significados assumem outra dimensão, mais profunda, espiritual, mística. Veja a oração por exemplo. Há seu aspecto exterior com suas formas e movimentos, e há a prece interior que toca o coração e envolve todo
o ser. Pode-se orar por anos e a prece não ser mais que forma. No Sufismo busca-se desenvolver um coração que possa orar, busca-se a compreensão e vivência dos aspectos mais profundos do Islam, com o objetivo de
permitir ao ser humano desenvolver, em vida, o potencial que lhe foi concedido por Allah. Não há distinção entre Sufismo e
Islamismo. Sufis são muçulmanos que buscam empenhar-se em suas comunidades, a viver os ideais islâmicos em sua inteireza. Hajj Sheikh Muhammad Ragip al-Jerrahi |
|